CONTO - DISTOPIA
Por Mazezinha Cruz
NEM TUDO SÃO FLORES
As flores se espalhavam pelos
jardins...floriam os campos, os quintais, roças e presenteavam os
namorados... Tudo ia bem. Embelezavam as
cidades com suas roupagens coloridas, tinham famílias! Sim, famílias: violetas,
jasmins, margaridas e também parentes próximos: outono, verão, primavera e um
muito longe inverno. Sempre se encontravam em festas, formaturas, casamentos, e,
muitas vezes, em velórios. O Ano de 2020 começou igual. Tudo estava na perfeita
normalidade com o direito de ir e colorir das flores.
Viviam e viam o mundo de modo diferente. Mas eis
que surge um ser invisível e lhes impede de trabalhar. Elas, então, se
perguntam: Por quê? - Se elas sempre se espalharam tranquilamente pelos vales,
campos e colinas... É bem verdade que já conheciam outros ataques e perigos que
circulavam na terra. Nunca porém foram impedidas de florir e embelezar a Terra.
Começaram então uma pesquisa. Descobriram que o vírus é menor que uma gotícula,
sem cor, sem cheiro, que não se vê, mas, tem nome. É....Tem nome: Covid19.
As flores ficaram imóveis e
cederam na busca de compreender e proteger-se de todos e qualquer coisa. Tudo
parece sombrio e desanimador. Certa manhã,
como se não bastasse o medo, a “coisa” chamada vírus trava uma luta desigual
com as flores. Surgem notícias de que elas
morreram, muitas flores, de várias famílias. Não puderam proporcionar aos olhos dos humanos
um panorama esplêndido de beleza e delicadeza, a que estavam acostumadas a
fazer, em milhares de ocasiões, junto com a Mãe Primavera.
As flores tinham planos e
imaginaram um mundo em que todos viveriam em montanhas coloridas, campos
floridos, na mesma harmonia, paz e tranquilidade. Entretanto, a coisa tão
pequena e invisível, causadora da morte e da doença, parecia zombar de quem
tenta lhe enfrentar! Os remédios proibidos, sem vacinas, morte pra todo lado...
e amedronta o mundo, ao tentar paralisá-lo.
As flores indagam: - e, nossa inteligência,
serve para quê? A sensibilidade, qual a
sua utilidade? E a imaginação? Começam então uma revolução. Elas fazem coisas
que utilizam a sensibilidade, a inteligência, a imaginação: existem flores na
música, poesia com flores, quadros com flores, contos com flores, cantam as
flores... Presas em seus quintais, descobriram o ambiente digital, lugar rico
em humanidade - porque não é uma rede de fios, mas de pessoas humanas. Começam
a conversar por aparelho celular, por computadores, até reunião e conferências elas
começam a realizar...
Descobriram um modo novo de
espalhar a beleza das artes, e qual a beleza da arte? - Ora ...expressar as nossas emoções,
provocar novas ideias, promover reflexões... As flores sonhavam, elas queriam
mudar a história do mundo. E o Corona Vírus? Continua matando... choram as
flores, mas continuam exalando perfume, cores, beleza... mas estão
desaparecendo dos jardins, rosas, margaridas, violetas, em um piscar de olhos.
Essa coisinha
quase invisível, chamada Covid19, precisa ser detida o mais rápido possível.
Ela não se compadece. Primeiro mata as mais antigas árvores, depois, as
frutíferas, por último, os brotos. As flores lamentam: - Temos um sistema de
defesa e combate que todos já conhecem, foice, tesouras... Assim, elas, sem
trégua, estabelecem uma luta constante para se reproduzirem, mas, o sistema não
reconhece o invisível. Dessa forma, não conseguem combatê-lo.
Esse vírus maligno vai
usando de sua propriedade de levar embora para sempre, sem direito a despedidas.
As flores mais lindas e valiosas, que nós seres humanos já plantamos, estão
indo embora. Em meio a tanta tormenta, uma flor foi especial foi duramente
atingida. Aconteceu assim, na família da
Hortência. Sua tia, moça solteira, tinha
lá seus 40 anos, estava de casamento marcado para o mês de maio, planejava ter
um filho logo que se casasse. Seu noivo, moço bonito, sargento da PM, viúvo sem
filhos, foi, no dia 20 de março, buscar a mãe e o pai da Camélia, sua noiva, na
Rodoviária.
Em cinco dias, a mãe,
começou a ficar murcha, foi para o hospital. Depois de mais cinco dias, o pai
foi para a UTI, Camélia ficou trancada no quarto recebendo pratos de comidas
dos vizinhos, que os deixavam no quarto, mas do lado de fora da porta. Seu
noivo sempre ligava para saber como ela estava. – Resistindo, dizia ela. Passou
uns dias sem ligar. A noite ouvindo o jornal: - “Dentre as vítimas, que são
mais de 100 mil pessoas, algo chamou atenção... um sargento da PM de
aproximadamente 45 anos, antes de ir para a UTI, deixou uma carta para a sua
noiva, no envelope escrito: Remetente - Osvaldo.
Destinatário: minha noiva Camélia. A
mensagem: O hospital lhe aguarda para reconhecer o corpo. O celular toca:
- Alô...
-
Tia?
-
Oi
-
Como está a vó?
-
Morreu...
-
E o vô
-Morreu...
- E o Osvaldo?
-
Você pode ir ao ML, reconhecer o corpo para sepultar? É porque tô com Corona,
não posso sair do quarto.
- Sim, eu vou.
Hortência desligou o telefone. A tia Camélia
ficou viúva sem se casar, perdeu o filho antes de ser concebido, mas Hortência
foi ao necrotério e reconheceu o corpo do futuro marido da tia, o sargento da
PM, e acompanhou o enterro.
A noite aparece, vem o luar, Hortência chora. A tia Camélia era sua
única parente. Sua mãe, seu pai e suas duas irmãs, já haviam morrido no ataque
ao seu jardim. No entanto, a tal “coisa” continua matando, como um entrave,
barrando as flores de embelezar e colorir a vida. Dizem que a esperança se chama
VACINA, que está a caminho para derrotar o maligno Covid19. Ela olhou-se no
espelho. Pensa com seus botões: Tenho a mim, Deus e aos meus amigos.... Secou
as lágrimas e seguiu adiante.
Este conto é uma Distopia - Histórias que contam catástrofes e pandemias.
Revisão de:
Fátima Cordeiro - Pedagoga - Imortal da AAL
Margarete Prado - Doutora em Letras - Imortal da AAL.
Se gostou, deixe seu comentário e volte outras vezes!
Lindo demais! Peço licença para espalhar para o mundo!
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